Biodiesel ainda vale a pena?

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Sob pressão dos produtores de biodiesel, o governo estuda ampliar a mistura de óleos vegetais no diesel vendido no país, que têm capacidade ociosa suficiente para dobrar o patamar atual, de 5%. A mudança está em estudo pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e, segundo fonte, pode ser apreciada em reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) ainda este ano. Ao mesmo tempo em que tem potencial para reduzir as importações de diesel, com impacto positivo no caixa da Petrobras, a medida é vista com desconfiança por especialistas, diante da perspectiva de repasse do custo aos consumidores. 
 
O mercado esperava que o tema fosse avaliado na última reunião do CNPE, realizada em junho. A expectativa agora, segundo fonte ligada à área energética, é que seja incluído na pauta do próximo encontro, previsto para dezembro. A proposta em análise prevê a ampliação dos atuais 5% para 7%, mistura conhecida como B7. A Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (Aprobio) argumenta que a medida ajuda a minimizar as perdas da Petrobras com a importação de diesel, que somaram 6,3 bilhões de litros entre janeiro e julho de 2013, alta de 29,3% com relação ao mesmo período de 2012. 
 
“Estamos importando 20% do consumo de diesel do país, com prejuízos à Petrobras”, comenta o diretor superintendente da Aprobio, Júlio Minelli. De fato, a estatal vem sofrendo com a defasagem dos preços internos com relação às cotações internacionais dos combustíveis. Pelas contas de Minelli, a empresa vende a R$ 1,40 por litro, no Brasil, o diesel que importa a R$ 1,84 por litro. Apenas no segundo trimestre de 2013, a área de abastecimento da companhia teve prejuízo de R$ 2,5 bilhões com a vendade gasolina e diesel mais baratos no mercado interno. 
 
De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o Brasil tem hoje capacidade de produção superior a 7 bilhões de litros de biodiesel por ano. Em 2012, a produção do combustível chegou a 2,7 bilhões de litros. Todo o biodiesel vendido nos postos é adquirido em leilões realizados pela agência reguladora e depois repassado às distribuidoras de combustíveis. No último leilão, o preço médio do produto ficou em R$ 1,85 por litro, sem considerar os impostos - valor equivalente ao pago pela Petrobras pelo diesel importado. 
 
“Há, evidentemente, uma capacidade de produção acima da demanda, mas a decisão final cabe ao CNPE. No que depende da ANP, responsável pela fiscalização e do abastecimento, é possível fazer (o aumento da mistura)”, diz o diretor da ANP Florival Carvalho. Consultado, o MME informou que realiza “de maneira permanente estudos sobre o estágio atual e perspectivas para o futuro do programa de biodiesel” e que só vai se pronunciar após a conclusão dos estudos. 
 
O professor da Universidade Federal de Itajubá (Unifei) e especialista em biocombustíveis, Luiz Augusto Horta, contesta a afirmação de que o aumento da mistura traria ganhos ao país. “O biodiesel é mais caro do que o diesel de petróleo vendido pela Petrobras. Alguém vai ter que pagar essa conta”, argumenta Horta, que foi diretor da ANP. Ele acrescenta que, para produzir um litro de biodiesel de soja (principal matéria prima usada no país), é necessário, pelo menos, 0,5 litro de diesel de petróleo. “Não é a fonte mais eficiente do ponto de vista energético.” 
 
Horta defende uma reavaliação das políticas para o biodiesel antes de qualquer decisão sobre aumento da mistura. “O Brasil deu um passo importante na criação do programa, mas à medida que o tempo passa, é preciso aprimoramento”, opina. 
 
Criado em 2004, o programa do biodiesel tinha perspectiva de atingir o percentual de 5% na mistura apenas em 2013. O crescimento inesperado da capacidade de produção, porém, levou o governo a antecipar a meta para 2010. 
 
Desde então, mantém-se no mesmo patamar, embora os investimentos em ampliação da capacidade venham crescendo. Mas, ao contrário do previsto inicialmente, não foram pequenos agricultores e, sim, grandes produtores que garantiram a oferta do combustível. Atualmente, 80% do biodiesel consumido no país tem como matéria-prima o óleo de soja, principal produto da agroindústria brasileira. 
 
“É preciso incentivar matérias-primas mais adequadas”, afirma Horta, citando a palma como exemplo. A segunda principal fonte é o sebo de boi, segundo a ANP. O insumo possui grande eficiência energética, porém, a capacidade de criação de gado é limitada. 
 
A Aprobio diz que o impacto, no preço final, de um aumento na mistura de biodiesel é pequeno, em torno de R$ 0,016 por litro. E cobra mais previsibilidade do governo com relação ao crescimento da demanda. “Quando o governo antecipou para 2010 a mistura de 5%, sinalizou que haveria novos aumentos. Houve bastante investimento em ampliação da capacidade”, diz Minelli. Hoje, 70 usinas estão autorizadas a produzir biodiesel no país. Em agosto, a ANP autorizou a construção de três novas unidades e a ampliação de outras cinco. Além dos leilões da ANP, os produtores podem vender o produto diretamente a consumidores que optaram por usar o produto em percentuais maiores do que o obrigatório. 
 
Mais caro, óleo de mamona não é usado pelo setor
 
A mamona, principal bandeira do lançamento do Programa Nacional do Biodiesel, ainda no governo Luiz Inácio Lula da Silva, não vingou como matéria-prima para a produção de combustível. A notícia, no entanto, não chega a ser ruim, uma vez que o óleo extraído da mamona é vendido a preços bem mais altos para outras indústrias, como as de tintas, lubrificantes e de cosméticos, por exemplo. 
 
“A mamona tem usos muito mais nobres. O óleo de mamona hoje custa em torno de R$ 5 mil a tonelada, enquanto o óleo de soja sai a R$ 2 mil”, diz o diretor superintendente da Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (Aprobio), Júlio Minelli. O objetivo do governo era incentivar a agricultura familiar, garantindo geração de emprego e renda em regiões mais pobres do país, mas hoje o produto não figura na lista das principais fontes de produção de biodiesel. 
 
Destino diferente deve ter a cultura de palmas, considerada uma das matérias primas mais eficientes para a produção de combustíveis. Embora ainda não tenha participação relevante, a oleaginosa tem grande potencial de crescimento, diante de investimentos de empresas como a Vale e a Petrobras. A primeira tem um grande projeto no Pará, com o objetivo de produzir combustível para abastecer as composições que transportam sua produção de minério de ferro. 
 
“A vantagem das palmas é que são culturas permanentes, não precisam de plantio anual”, diz o professor da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), Luiz Augusto Horta, especialista em biocombustíveis. “É como a cana, que é plantada uma vez e garante cinco colheitas”, compara. A cultura de palma, porém, leva sete anos até atingir a maturidade. 
 
De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), além da soja, palma e do sebo bovino, a produção brasileira de biodiesel tem como matérias-primas a gordura de porco e de frango, no Sul, o óleo de algodão, no Nordeste, e óleo de fritura usado, principalmente, no Sudeste. Brasil Econômico 18/09/2013