Brasil: 72% de insatisfação

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O sentimento de frustração avançou consideravelmente entre os brasileiros no último ano, marcado por protestos generalizados, inflação em alta e baixo crescimento. Não tem precedentes nos anos recentes e contaminou negativamente a avaliação da população sobre os rumos do país, as condições da economia, o governo da presidente Dilma Rousseff e a Copa do Mundo, revela levantamento feito, entre os dias 10 e 30 de abril, pelo Pew Research Center, um dos mais importantes institutos de pesquisa dos Estados Unidos. Segundo a sondagem, divulgada ontem, 72% dos brasileiros se dizem insatisfeitos com a situação do país, e 85% apontam a escalada dos preços como preocupação central, superando temas como criminalidade (83%) e corrupção (78%).

Há 12 meses, 55% estavam insatisfeitos, pouco acima dos 50% de 2010, último ano do governo Lula e início da série histórica. A economia tem papel central no mau humor corrente. Dois terços (67%) dos 1.003 entrevistados no Brasil com mais de 18 anos consideram a situação econômica ruim, após quatro anos seguidos em que a percepção positiva foi amplamente dominante.

Em 2010, consideravam boa a situação da economia 62% dos brasileiros, percentual que chegou a 65% em 2012 e era de 59% no ano passado. Em abril, apenas 32% dos pesquisados estavam satisfeitos com os rumos econômicos. Mas 63% acreditam que as condições vão melhorar nos próximos 12 meses.

— Se pegamos desde 2010, as avaliações sobre a situação geral do país e a economia não estavam alinhadas. A opinião sobre a economia deu uma guinada e certamente é o fator que alimentou o rápido pessimismo dos brasileiros — afirma a principal analista da pesquisa, Juliana Horowitz.

Depois da inflação, criminalidade e saúde (83%) e corrupção no meio político (78%) aparecem como principais desafios para os brasileiros. A falta de oportunidades de emprego (72%), o hiato entre pobres e ricos (68%) e a baixa qualidade das escolas (64%) completam a lista.

— Esses problemas sempre estiveram presentes. O que chama a atenção é que o nível atual de frustração que os brasileiros expressam não tem paralelo em anos recentes — afirma Juliana, acrescentando que tamanho descontentamento, acumulado de forma tão rápida, só foi captado recentemente pelo Pew em países que passaram por revoluções, como o Egito.

DILMA TEM DESAPROVAÇÃO DE 63%

Para Paulo Sotero, diretor do Instituto Brasil do Wilson Center, think tank sediado em Washington, o resultado aponta um quadro difícil para a reeleição de Dilma. Ele lembra que a economia brasileira terminou o primeiro trimestre estagnada (expansão de 0,2%) e pode estar em recessão.

— Terminado o futebol, as pessoas voltarão à realidade, e a inflação, particularmente, é um tema essencial nas eleições brasileiras — avalia Sotero.

Curiosamente, a melhor avaliação da presidente é na condução da economia. Ainda assim, 63% desaprovam sua gestão econômica, frente a 34% que a chancelam. Os números pioram para o governo Dilma nos outros oito temas consultados: pobreza (65% de desaprovação), preparação da Copa do Mundo (67%), educação e política externa (71%), transporte público (76%), saúde e criminalidade (85%) e corrupção (86%).

De forma geral, o país está dividido sobre Dilma: 52% acham a influência de sua Presidência negativa para o Brasil, ao passo que 48% a consideram positiva. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010, recebeu a boa nota de 84% dos entrevistados. Brasileiros de maior renda e mais escolarizados desaprovam a presidente de forma mais contundente, mas mesmo nas classes de menor poder aquisitivo e educação a avaliação negativa se sobrepõe.

A sondagem, porém, revela que Dilma é, pessoalmente, mais apreciada que seus dois principais adversários este ano. Perguntados se tinham uma visão favorável ou desfavorável da presidente, 51% escolheram a avaliação positiva.

No caso do presidenciável do PSDB, Aécio Neves, 27% o veem favoravelmente, contra 53% negativamente. Em relação a Eduardo Campos, do PSB, 24% têm visão favorável e 47%, desfavorável. Porém, um em cada cinco entrevistados ainda não tem opinião formada sobre Aécio, e um a cada quatro, sobre Campos.

Lula, o político mais bem avaliado da sondagem (66% de visão favorável), apresenta-se como grande cabo eleitoral, assim como o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, que anunciou sua aposentadoria e é bem-visto por 60%. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sobre o qual 67% dos entrevistados têm visão negativa, recebe a pior avaliação.

Vários dos problemas que mais atormentam os brasileiros estiveram no centro das manifestações que tomaram as ruas do país no último no. No entanto, o levantamento do Pew mostra fadiga com o movimento: 47% consideram os protestos uma boa coisa, por terem jogado os holofotes sobre deficiências relevantes do país, enquanto 48% acham que eles foram nocivos.

COPA TERÁ IMPACTO NEGATIVO PARA 39%

O impacto da Copa do Mundo, um dos catalisadores da insatisfação nas ruas, é considerado negativo por 61% dos entrevistados, devido aos recursos públicos que o evento dragou e que poderiam ter sido investidos em serviços públicos. Apenas 34% afirmam que o Mundial será benéfico, por girar a economia e criar empregos.

O efeito da Copa para a imagem do Brasil perante o mundo não é uma unanimidade. Quase quatro em cada dez pessoas ouvidas (39%) acham que o impacto será negativo, enquanto 35% avaliam que será positivo e 23%, nulo.

Os brasileiros também acreditam que o Brasil deveria ser mais respeitado internacionalmente, opinião de 76% dos entrevistados. Porém, menos pessoas afirmam que o Brasil é ou se tornará uma das nações mais poderosas do mundo: o percentual combinado, que era de 77% em 2010, caiu a 59% este ano.

O Pew Research Center realiza pesquisas de sentimento em 82 países relevantes para os EUA, a fim de avaliar questões domésticas e temas de interesse americano. O Brasil, por exemplo, integrará levantamento sobre classe média no mundo emergente, a ser divulgado em setembro.