Brasil perde participação em mercado de etanol para EUA
O aumento da demanda mundial, um dólar fraco e uma produção interna recorde estão dando aos produtores de etanol dos Estados Unidos uma vantagem cada vez maior sobre os brasileiros nos mercados para exportação do álcool combustível.
Enquanto os produtores americanos buscam compradores no exterior, o apetite doméstico cada vez maior do Brasil mantém mais álcool dentro do país. O desequilíbrio ajudou o etanol americano, feito a partir do milho, a conquistar uma fatia crescente do mercado mundial, o que tem ajudado nos lucros de empresas como a Archer Daniels Midland Co., a ADM.
"Tudo que era exportado do Brasil está agora sendo despachado dos EUA", diz Marc Van Driessche, gerente de negociação da trading de biocombustíveis Greendiesel Trading.
As exportações americanas de etanol triplicaram no ano passado, para 13,2 milhões de hectolitros, em comparação com 4,3 milhões em 2009. Os principais destinos foram Canadá, nordeste da Europa e Brasil, segundo a Associação de Combustíveis Renováveis dos EUA.
O Brasil ainda está à frente dos EUA em exportações de etanol, mas a liderança encolheu. As exportações brasileiras somaram 19 milhões de hectolitros no ano passado, uma queda de 61% em relação a 2009, segundo a associação americana.
As trajetórias diferentes de Brasil e EUA são atribuíveis em grande parte à fraqueza do dólar diante do real, que dá uma vantagem competitiva aos exportadores americanos. O dólar caiu 39% em relação ao real desde o início de 2009. Outro fator é a alta nos preços do açúcar, que faz com que os usineiros desviem parte da cana-de-açúcar que seria usada no álcool.
Também há mudanças nos mercados domésticos de álcool combustível dos EUA e do Brasil.
Nos EUA, os produtores de etanol estão tendo dificuldades para aumentar as vendas internas ao mesmo tempo em que a produção cresce. A indústria alcooleira americana lutou muito para aumentar a quantidade de etanol misturada à gasolina. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA permitiu em janeiro que os veículos montados a partir de 2001 usassem uma mistura de 15% de etanol. Antes, a mistura permitida era de 10%. Mas, como as montadoras ameaçam anular as garantias dos motores e as refinarias se negam a vender a mistura com mais álcool, os produtores de etanol buscam vender no exterior a oferta crescente de que dispõem.
Enquanto isso, a economia em crescimento do Brasil produz demanda por carros, e a porcentagem de álcool na gasolina é maior do que nos EUA. A produção brasileira de automóveis bateu recorde em 2010 e este ano, em janeiro, as vendas chegaram a quase 245.000 veículos, um aumento de quase 15% sobre o mesmo período de um ano atrás, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, a Anfavea.
A crescente demanda brasileira por etanol superou a sua própria oferta, reduzindo as exportações do biocombustível e até exigindo importações dos EUA, diz Adhemar Altieri, diretor de comunicação da Unica, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar.
As exportações de etanol puro dos EUA não têm direito a um crédito fiscal de US$ 0,45 por galão (US$ 0,12 por litro) oferecido pelo governo americano. Mas a produção apoiada pelo crédito tributário está cada vez mais sendo enviada à Europa na forma da mistura de 90% etanol e 10% gasolina. Essa mistura, chamada E90, permite aos traders usar a mínima quantidade de gasolina, receber o crédito e vender o combustível à Europa com desconto. Pessoas do setor nos EUA e na Europa descrevem a E90 como produto para um mercado de nicho, que cresceu recentemente para 189.000 hectolitros em exportações por mês.
A exportação mina o argumento popular de que o álcool aumenta a independência energética dos EUA, reconhece Jeff Lautt, diretor de operações corporativas da Poet, a empresa americana que é a maior produtora de etanol do mundo. Ele diz que preferiria que o mercado americano permitisse maior uso doméstico, em vez da crescente demanda por exportação.
"Não faz sentido estar exportando", diz. "É realmente motivado pelo fato de que temos essas restrições do mercado."
Lautt prevê que as vantagens que os EUA têm sobre o Brasil continuem "pelo futuro próximo".
Mas Richard Lobb, porta-voz do Conselho Nacional do Frango dos EUA, uma das muitas associações de produtores de carnes que se opõem ao etanol porque aumenta os custos da alimentação animal, diz que o verdadeiro motivo por trás das exportações é que muitos produtores entraram no mercado em busca de "dinheiro fácil". "A razão pela qual o etanol está disponível para exportação é que a indústria tem excesso de capacidade", diz.
Valor Econômico