Caos no Egito é nova ameaça à economia
Os protestos e saques causados no Egito pelo impasse entre manifestantes e o presidente Hosni Mubarak ameaçam ter repercussões econômicas na região e no mundo. A economia do Egito é relativamente pequena - a quarta maior do Oriente Médio, com PIB de quase US$ 217 bilhões em 2010, segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional. Mas o país tem um papel econômico maior por abrigar uma das rotas comerciais e de petróleo mais importantes do mundo, o Canal de Suez.
O Egito também é o maior comprador mundial de trigo e exporta um volume significativo de algodão. E também tem um dos mercados financeiros mais globalizados da região, o que faz com que as bolsas do país sejam uma aplicação popular entre os investidores voltados a mercados emergentes.
No curto prazo, a maior preocupação econômica mundial continua sendo a cotação do petróleo. O Egito não é um grande produtor da commodity. Mas um volume significativo de carregamentos de petróleo e derivados passa diariamente pelo Egito, vindo do Oriente Médio para a Europa e os EUA.
Cerca de 1 milhão de barris diários de petróleo e refinados são transportados rumo ao norte pelo Canal de Suez, segundo estimativas de Washington. Um oleoduto ligando o Mar Vermelho e o Mediterrâneo transporta mais 1,1 milhão de barris diários. Juntas, essas rotas movimentam cerca de 2% da produção mundial de petróleo.
Se o transporte do óleo pelo Egito for interrompido, o suprimento europeu (e a cotação mundial) pode ser "bastante afetado", disse Dalton Garis, professor no Instituto do Petróleo, um centro de pesquisas em energia de Abu Dhabi.
Até agora, o fluxo de petróleo pelas duas rotas parece não ter sido afetado. Mas o toque de recolher do anoitecer ao amanhecer no país obrigou as empresas de transporte marítimo que operam no canal a alertar no fim de semana para possíveis atrasos e dificuldades em contatar agentes e pilotos, e também para obter peças de reposição. Se levado em conta o transporte de petróleo, cerca de 8% do comércio marítimo mundial passa pelo canal, segundo o Egito.
"Os protestos não afetaram o tráfego de navios", disse ontem Abdul Ghani Mohamed Mahmoud, porta-voz da Autoridade do Canal de Suez. O WSJ não localizou autoridades da Arab Petroleum Pipeline, dona do oleoduto Suez-Mediterrâneo, para comentar.
O contrato futuro do petróleo referencial dos EUA subiu mais de 4% na sexta, após manifestantes enfrentarem a polícia e o Exército.
Em meados de 2009, os mercados de petróleo quase não se mexeram quando ocorreram protestos no Irã, um dos maiores produtores mundiais de petróleo. A reação diferente do mercado, desta vez, ressalta um cenário mundial muito diferente de oferta e demanda apenas 18 meses depois. Depois de cair fortemente por causa da crise financeira e econômica, a demanda se recuperou. Isso deixou os mercados mais sensíveis a ameaças de problemas na oferta.
Além do papel do Egito como rota de transporte do petróleo, o temor de que a turbulência se espalhe para produtores maiores pode influenciar mais o mercado.
A Argélia, importante produtora de petróleo e gás natural, tem enfrentado nas últimas semanas protestos antigoverno parecidos com os que tomaram conta do Egito. A mais recente onda de turbulência regional começou este mês na Tunísia e culminou na derrubada do autocrático líder do país, e também causou tumulto no Iêmen. A Arábia Saudita e os outros países do Golfo Pérsico, ricos em petróleo, conseguiram até agora evitar as manifestações, mas líderes árabes deram a entender que temem que a revolta se espalhe.
Embora a produção egípcia de petróleo não seja grande, o país se tornou um exportador considerável de gás natural. Parte segue por gasodutos para o Oriente Médio. Mas a maioria do gás do Egito é transportada na forma de gás liquefeito supercondensado em navios-tanque aos EUA e à Ásia.
Até agora, as operações de extração de petróleo e gás aparentemente não foram afetadas. O diretor-presidente da produtora regional de gás Dana Gas PJSC, Ahmad al Arbeed, disse que a empresa está operando normalmente.
Mas as petrolíferas internacionais fecharam seus escritórios no Cairo. Tanto a BP quanto a Royal Dutch Shell fecharam seus escritórios ontem. Um chefe de segurança da Shell disse que parte dos funcionários expatriados saiu do país.
Os outros mercados de commodities também podem ser extremamente influenciados pelos acontecimentos no Egito. O contrato futuro do trigo caiu mais de 2% na sexta em Chicago, em parte por causa dos temores de que uma possível derrubada do regime no Cairo possa prejudicar a capacidade egípcia de pagar pelo trigo. Nomani Nasr Nomani, vice-presidente da Autoridade Geral de Suprimento de Commodities, disse que as remessas de trigo estão sendo descarregadas normalmente nos maiores portos do Egito, como o de Alexandria e o de Porto Said.
Os exportadores de algodão podem ser prejudicados nos próximos dias pela falta de segurança e o toque de recolher no país. A cotação mundial da fibra já atingiu o maior nível dos últimos 140 anos.
E os investidores das bolsas também estão se preparando para sentir o efeito. Embora o mercado acionário do Egito seja menor que outros do Oriente Médio, é um dos mais abertos a investidores estrangeiros. É acompanhado de perto por investidores internacionais e integra o índice MSCI de mercados emergentes. A bolsa saudita, muito mais capitalizada, ainda é considerada um novo mercado. A bolsa egípcia está fechada desde que começaram os protestos.
(Colaboraram Shereen el Gazzar, Tahani Karrar-Lewsley e Nikhil Lohade, de Dubai)
Valor Econômico