'Correção do mínimo deve andar junto com a do IR'
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, defendeu a criação de uma política permanente de correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), que caminhe junto com a valorização do salário mínimo. Ao Estadão, Marinho confirmou que levou a pauta do reajuste da tabela ao presidente Lula, na semana passada. “Tem de estabelecer uma política permanente, como tem com o salário mínimo”, disse. “Nós desejamos que as coisas caminhem conjuntamente. Se depender de mim, elas vão andar.”
O ministro afirmou, ainda, ser necessária uma regulamentação do trabalho por aplicativos. “Vamos enquadrar esse povo, chamar as empresas. Dona Uber, venha cá. Dona ifood, senta aqui”, disse. Acompanhe os principais trechos da entrevista:
O governo terá meta de emprego, como no passado? Não trabalhamos com meta numérica. Vamos trabalhar com uma estratégia de valorização do salário mínimo que ajude a fomentar a atividade econômica. O trabalho tem de ser formal. Trabalho informal serve para explorar.
Será possível pagar o salário mínimo de R$ 1.320 a partir de 1.º de maio?
Se a política de valorização do salário mínimo não tivesse sido interrompida, o valor estaria hoje em R$ 1.396. Mais importante do que o valor do salário mínimo de 2023 é falar da retomada dessa política. Vamos fazer exercício de cada proposta do que impactaria nos próximos dez anos.
Esse tema causa preocupação por causa do impacto nas contas públicas?
Em 2005, quando assumi o Ministério do Trabalho após liderar a Marcha do Salário Mínimo, trouxe a sugestão (da política de valorização) e o mercado reagiu com a preocupação de que iria impactar a inflação. Eu dizia que teríamos de criar uma sintonia para aumentar a renda, gerar emprego e controlar a inflação. Nós mostramos que era possível. Com previsibilidade, o mercado se prepara. O empresário não pode esperar crescer a demanda de consumo para depois produzir. Ele tem de se preparar para produzir sabendo que a demanda vai chegar. Não se controla a inflação somente por arrocho salarial, por restrição de consumo e de crédito com juros altos. Pode-se controlar a inflação a partir da oferta.
Mas, para as contas públicas, o problema de aumento das despesas continua? Estou falando de crescer a receita da Previdência. O pessoal só consegue enxergar um lado dessa conta. Sempre convoco meus colegas da área econômica, especialmente os técnicos, a enxergar os dois lados. O ministro (da Fazenda) tem uma boa visão sobre isso. Eu e o (Fernando) Haddad estamos, ali, afinadinhos. Vai dar custo? Vai, mas vai impactar na receita.
O sr. levou a pauta da correção da tabela do Imposto de Renda para na reunião sobre o mínimo?
A senhora está bem informada.
Em 2023, quem ganha menos de um salário mínimo e meio já paga IR. É justo? Primeiro, eu acho injusto uma pessoa ganhar menos de um salário mínimo e meio. Quando Lula falou de aumentar para R$ 5 mil a faixa de isenção, ele não falou de fazer imediatamente (mas sim de), uma política que vá recuperando para chegar a esse patamar. Portanto, tem de estabelecer uma política permanente, como tem com o salário mínimo. A ideia é construir sempre olhando o espaço fiscal para não impactar a inflação.
Haddad diz que não pode reajustar a tabela em razão do princípio da anterioridade, mas o PT já fez isso. O sr. mesmo já fez isso.
Eu, não. A área econômica. Eu só negociei.
As duas políticas, aumento do salário e correção da tabela do IR, vão andar juntas? Nós desejamos que as coisas caminhem conjuntamente. Se depender de mim, elas vão andar.
O seguro-desemprego não alcança o trabalhador informal. O sr. não acha que alguma solução tem de ser dada? É por isso que tem de ser formal. A irresponsabilidade da reforma trabalhista tem de ser visitada. As empresas foram criando os conceitos de PJ (pessoa jurídica) e de MEI (microempreendedor individual) para burlar e fraudar a legislação trabalhista.
E como enfrentar isso?
Vamos ter de reorganizar o aparelho de Estado para fiscalizar, investigar e cumprir a legislação. Há necessidade de novos concursos. Estão desmontando totalmente a proteção ao trabalho. Tem muito trabalho escravo no Brasil que a sociedade tolera.
Mas qual é a saída?
Nós vamos instituir um processo de negociação. Em primeiro lugar, chamando as empresas. Dona Uber, venha cá. Dona ifood, senta aqui. Não dá para ter uma jornada extenuante igual vocês estão exigindo. O cidadão trabalha 16 horas por dia para levar o leite para casa. É exploração. Vamos estabelecer padrão de remuneração, de proteção social. Um trabalhador de aplicativos, um caminhoneiro, um mototaxista, motoboy não tem nenhuma segurança. É preciso que seja regulamentado. •
Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo