Decisão estratégica no reajuste da gasolina

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Quando entrou a presidente Dilma Rousseff nasceu a esperança que poderia se iniciar uma nova política econômica desatada do medo do fantasma da inflação, levando as taxas de juros próximas dos níveis internacionais.   Mais do que isso, ela poderia, pelo que impressionou no discurso de posse, ser uma estadista com visão estratégica do País, potencializando-o para o futuro.   Decepção. Mas, aos poucos, essa esperança foi-se dissipando. A primeira decepção ocorreu logo no início do governo quando face à inflação em ascensão ocorrida entre outubro de 2010 e abril de 2011 autorizou o Banco Central a iniciar uma série de elevações da Selic como se isso resolvesse o problema inflacionário cuja raiz era externa.   Deixou correr os efeitos das medidas macroprudenciais que encareceram o crédito visando frear o crescimento do consumo. O resultado foi a derrubada do crescimento para 2,7% em 2011, diante do crescimento mundial de 3,9% e de 6,3% nos países emergentes.   Questionado na ocasião diante do fracasso do crescimento e da inflação no teto da meta em 6,5%, o governo respondeu às críticas argumentando que isso não iria afetar o crescimento de 2012, cuja meta era de 5%, a mesma frustrada em 2011.   Descrédito. Isso começou a levantar a suspeita sobre a competência do governo em saber conduzir a economia. Esse sentimento foi se consolidando diante de novas promessas de retomada do crescimento e mais frustração, desta vez, mais séria, como crescimento de 0,9% do ano passado, diante de 3,1% na média mundial e de 5,1% nos países emergentes.   O fraco crescimento derrubou a arrecadação e a obtenção dameta de resultado primário. Em resposta mais um erro: o uso de receitas atípicas, inclusive de realização que só ocorreria no futuro, contrariando a Lei de Responsabilidade Fiscal. Aí o descrédito atingiu em cheio a política fiscal do governo, taxada de fazer contabilidade criativa para chegar à meta de resultado primário.   Mas ainda sobrava um fio de esperançap ara retomar o crescimento. A presidente Dilma Rousseff tomou a iniciativa de baixar as taxas de juros do sistema financeiro, argumentando corretamente que não havia justificativa técnica para serem tão elevadas, travando o crescimento. Nesse campo, o sucesso foi parcial, mas distante do necessário. Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade, as taxas para financiamentos em 12 meses passaram, no caso da pessoa física, do nível de 120% para 90%, e da pessoa jurídica, de 60% para 45%. Ainda são as mais altas do mundo. E a presidente não voltou a tocar mais nessa questão. Deve ter ficado satisfeita com a redução alcançada.   Petrobrás. Mas o que mais chama a atenção sobre os desacertos da política econômica e da falta de visão estratégica do governo é a política de preços imposta à Petrobrás.   O ex-presidente Lula ressaltava em várias ocasiões o sucesso da Petrobrás em suas descobertas em mar profundo, da riqueza que o País tinha nas camadas do pré-sal. Essa riqueza incalculável seria transformada em realidade com a força financeira e domínio tecnológico extraordinário que a Petrobrás tem na extração em águas profundas do gás e petróleo.   Era a autossuficiência no petróleo e o futuro sorrindo para as próximas gerações. E mais, o País crescia produzindo energia limpa e se transformaria em importante fornecedor mundial de etanol e biodiesel. Lula estava certo. Tudo indicava isso. A tecnologia existia e a Petrobrás é líder internacional nisso. A força financeira também. A economia que seria trazida aos diversos setores econômicos seria imensa e as perspectivas eram de benefícios crescentes com o tempo. A produção de etanol e biodiesel traria imensos benefícios.   Mas as boas expectativas foram aos poucos se diluindo face aos desafios postos à empresa nas compras com elevado conteúdo nacional e participação no pré-sal. A diluição foi-sedando com a Petrobrás pedindo que o governo reajustasse os preços dos combustíveis, que se afastavam cada vez mais dos níveis praticados internacionalmente.   O governo alardeava as façanhas da empresa e, ao mesmo tempo, manifestava sua ação, mantendo os preços dos combustíveis artificialmente baixos para não correr riscos de aumento da inflação.   Com a entrada de Dilma Rousseff, nova esperança nasceu. Logo no início do mandato, trocou o presidente da estatal por uma funcionária de carreira da empresa, considerada apta para alcançar os objetivos traçados. E a nova direção da Petrobrás voltou a solicitar o reajuste dos combustíveis para poder viabilizar seu plano de negócios já aprovado pelo governo.   Mas o que se esperava de uma decisão pragmática e, finalmente acertada, não ocorreu e os pequenos reajustes autorizados ficaram muito aquém do necessário. Assim, continuou a se agravar a situação financeira da empresa, que foi ampliando a dependência de empréstimos do BNDES e externos em nível já elevado, próximo ao limite de rebaixamento da sua classificação de risco. A bola de neve crescia.   Ameaça e decisão. Agora com a depreciação cambial em curso, cuja magnitude é difícil de se prever, os estragos em cima da endividada empresa e o rombo causado pela importação crescente de gasolina a custo cada vez mais alto vão exigir aumento muito maior do que as doses insuficientes autorizadas.   O governo agora está encurralado. Prometeu inflação abaixo da ocorrida em 2012. O reajuste necessário se tornou bem maior face às decisões anteriores e o próximo ano é eleitoral sendo difícil a concessão de novo reajuste. Armou sua própria armadilha!   Parece mais provável que o governo adote a política de alguns reajustes conforme o comportamento do câmbio, mas uma coisa é certa: se não perceber que deve dar o reajuste necessário, que é o que acaba com a defasagem na comparação internacional, e continuar usando a Petrobrás como biombo da inflação, será responsabilizado pelo desastre em perspectiva.   As promessas de crescimento econômico, do futuro do etanol e do biodiesel já se foram. Outros países avançaram e ocuparam o espaço que deixamos de ocupar.   A descoberta e o uso rápido e crescente do gás de xisto nos EUA e outros países que partem com decisão nessa exploração e produção podem tornar inviável a extração do gás e petróleo do pré-sal face: a) aos atrasos no cronograma do pré-sal e na ampliação da capacidade de refino; b) à fragilização financeira da Petrobrás e; c) ao custo elevado da extração por causa da profundidade em que se encontra o petróleo e gás, diante do xisto que está a poucos metros de profundidade e em terra.   Talvez um lampejo de percepção da ligação da mobilidade urbana, que é urgente e estratégica, com a elevação do preço da gasolina salve de mais um fracasso. Há que tomar decisão estratégica no reajuste da gasolina. O passado, no entanto, não aponta nessa direção. Vamos ver.

O Estado de S. Paulo (Amir Khair)