Em DF: Postos de combustível terão 15 dias para se defender de prática de cartel
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Em conclusão preliminar sobre o mercado de combustíveis do Distrito Federal, divulgada ontem com exclusividade pelo Correio, a Secretaria de Direito Econômico (SDE) admite pela primeira vez a possibilidade da prática de cartel na capital do país. O órgão ligado ao Ministério da Justiça diz ter reunido
informações contundentes para avançar nas investigações. Em nota técnica, a SDE fala em “elevada probabilidade de ocorrência de tal infração” e associa a combinação de preços às margens de revenda da gasolina e do etanol.
As quatro distribuidoras e as 16 maiores redes de postos em atuação na capital do país, além do sindicato que representa o setor, foram notificados ontem e terão 15 dias para apresentar defesa. Os documentos devem chegar aos destinatários até o fim desta semana. O Ministério da Justiça quer entender por que os preços são praticamente os mesmos em todo o DF e o que leva os reajustes a ocorrerem sempre no mesmo período. A SDE também cobra explicações para o fato de os empresários não repassarem aos consumidores as diminuições de valores por parte das distribuidoras.
Em 57 páginas, o órgão detalha, por meio de gráficos, as margens aplicadas pelas principais redes do DF, consideradas fora do comum. Os percentuais de lucro superam a média nacional, especialmente no caso do etanol. O documento reforça a existência de oligopólio no mercado, o que facilita a adoção de práticas anticoncorrenciais. O Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis e de Lubrificantes do DF (Sindicombustíveis-DF) é acusado de influenciar na “conduta
comercial uniforme” e dificultar o funcionamento de postos que cobram mais barato.
Apesar da equipe defasada, a SDE garante intensificar o trabalho de apuração. Novas informações serão solicitadas nas próximas semanas e o caso tende a seguir, no segundo semestre, para avaliação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Denúncias contra postos do DF não são novidade (veja Memória), mas dessa vez, após mudanças nas atribuições da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), revendedoras notificadas poderão ter o funcionamento cassado, se o Cade assim decidir.
Provas robustas
Técnicos da SDE dizem que a demora no avanço dos trabalhos se explica pela necessidade de colher provas ainda mais robustas. “As instituições públicas têm de agir para que a população tenha um resultado prático e concreto”, defendeu o deputado federal José Antônio Reguffe (PDT), autor da representação que culminou, em novembro de 2009, na investigação em questão.
Em nota, a Petrobras Distribuidora, uma das empresas investigadas, informou ainda não ter sido notificada. E acrescentou que “sempre pautou sua atuação pelo respeito às leis e às melhores práticas comerciais e concorrenciais, pela conduta ética e pelo respeito ao consumidor”. O secretáriogeral do Sindicombustíveis-DF, Amazildo de Medeiros, não quis entrar em detalhes sobre as acusações da SDE antes de receber a nota técnica, mas se mostrou surpreso com a conclusão preliminar. “Esse é assunto velho, já está tudo resolvido”, disse ele, no cargo desde janeiro deste ano.
O proprietário da rede Autoshopping, Daniel Oliveira, negou qualquer ingerência do sindicato no funcionamento de seus postos. O Sindicombustíveis-DF, com base nas investigações, teria questionado, por meio de correspondências, a venda de gasolina e de etanol em um dos postos da rede, localizado em um clube às margens do Lago Paranoá, onde os preços costumam ser inferiores. A informação foi confirmada pelo secretário-geral da entidade. O advogado da Gasol, a maior
rede do DF, não retornou a ligação da reportagem até o fechamento desta edição.
As irregularidades
Infrações cometidas no mercado de combustíveis, segundo a investigação:
» Margens de revenda e de distribuição estão acima da média nacional e, em determinados períodos, consideradas despropositalmente altas;
» Ocorre demora no repasse ao consumidor de queda de preços nas distribuidoras;
» Sindicato dificulta funcionamento de postos em clubes;
» Sindicato influencia conduta comercial uniforme ao divulgar reajustes futuros;
» Sindicato atua para impedir entrada de postos em supermercados.
Quinze anos de investigação
O mercado de combustíveis é alvo de investigações há cerca de 15 anos. Em 2003, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) indicou a prática de cartel em Brasília. Em 2004, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) condenou o então Sinpetro-DF e redes de postos por orquestrarem a lei distrital que impede a entrada de novos agentes no mercado. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) acumula uma série de ações contra os postos, entre elas a que limitou, em 2011, a margem de lucro dos revendedores.
Ainda no ano passado, a Secretaria de Direito Econômico (SDE) concluiu que a BR Distribuidora privilegiava a Gasol, a maior rede de postos do DF. Estudo da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) também apontou fortes indícios de combinação de preços. Desde 2008, uma ação direta de inconstitucionalidade para derrubar a lei que proíbe postos em supermercados aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). O caso está nas mãos do ministro Celso de Mello.
Correio Braziliense