Estresse cambial e desajuste fiscal elevam pressão para alta dos juros
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A disparada do dólar e a falta de margem – ou disposição – do governo para um ajuste fiscal rigoroso jogam cada vez mais pressão sobre o Banco Central,que sevê forçado, segundo economistas ouvidos pelo ‘Estado’, a subir ainda mais os juros para conter a inflação. “A solidão do BC é estonteante”, diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados. “Sem a política fiscal, terá de elevar o juro.”
Depois do “pibinho” de 2012, a esperança era que este fosse o ano da virada econômica, com mais estabilidade, investimentos e crescimento. A metade do ano passou, porém, sem que o País decolasse. Para piorar, o estresse no mercado de câmbio ao longo da semana sinalizou dificuldades ainda maiores.
A alta do dólar vai encarecer os importados, que hoje vestem e alimentam o brasileiro e compõem boa parte dos insumos das indústrias, pressionando a inflação. E é consenso entre boa parte dos economistas que o BC ficou sozinho para combatê-la. O mais racional neste momento seria que o governo reduzisse os gastos e isenções fiscais – ou seja, que adotasse a política fiscal contracionista.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, passou a semana conjecturando alternativas de austeridade fiscal, mas veio de cima o sinal de que a prática vai na direção contrária. Na quartafeira, enquanto o dólar seguia em alta para fechar em R$ 2,154 (o maior valor desde abril de 2009), a presidente Dilma Rousseff lançava uma linha de financiamento para os beneficiários do Minha Casa, Minha Vida comprarem eletrodomésticos. O pacote, de R$ 18 bilhões, será abastecido com recursos do Tesouro Nacional.
“Na primeira semana em que o mercado testa o Brasil, o governo vai na contramão e lança esse programa”, diz o especialista em finanças públicas Raul Velloso. “Está claro que o governo tenta ganhar a discussão no gogó porque não tem medidas fiscais concretas.”
Armadilha. Para controlar o câmbio, o BC pode usar as reservas, que estão na casa dos R$ 350 bilhões, e fazer operações que segurem a valorização. Mas também será obrigado elevar o juro. “Como teremos mais um ano de PIB fraco, fica claro que o País está preso numa armadilha de baixo crescimento”, diz Mendonça de Barros.
A semana terminou sem que os bancos revisassem as projeções de juro, mas no mercado futuro a taxa na primeira semana de 2014 se aproxima de 9% – quase um ponto porcentual acima dos 8% de hoje. As previsões para o PIB ficam entre 2,5% e 2,8% – mas longe dos 4% prometidos por Mantega.
Gastar demais neste momento cria um problema adicional. A alta do dólar é um fenômeno global. O Federal Reserve, o banco central americano, sinalizou que a recuperação da economia americana teve início. Os investidores começaram a tirar o dinheiro dos países emergentes para buscar novas oportunidades nos Estados Unidos.
“O padrão de fluxo de capitais para os Brics, nós incluídos, vai ficar diferente – mais ralo e, sobretudo, mais seletivo”, diz o economista Gustavo Franco, sócio da Rio Bravo Investimentos. A disputa pelos recursos entre os emergentes tende a se acirrar justamente no momento em que o Brasil deixou de ser o queridinho dos investidores.
“Não estamos numa crise cambial e podemos administrar os surtos da moeda, mas o País vive uma crise de confiança”, diz a economista Monica de Bolle, da consultoria Galanto. “É frustrante saber que ela é 100% de nossa autoria e não se reverte no curto prazo.”
O Estado de S. Paulo