Montadora tenta quebrar resistência ao Euro 5

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Em meio a um mercado que começa a dar sinais de arrefecimento, os fabricantes de caminhões encaram o duplo desafio de fazer girar os elevados estoques construídos para este início de ano, ao mesmo tempo em que tentam desmistificar a nova linha de veículos - desenvolvida para atender à nova regra de emissão de poluentes, conhecida como Euro 5.

Os esforços do setor incluem o financiamento dos estoques de revendas, aliado a taxas de financiamento subsidiadas ao consumidor e uma pesada campanha de divulgação na mídia. Os caminhões da nova tecnologia Euro 5 - obrigatória a partir de janeiro - começaram a ser produzidos em escala comercial no fim do mês passado, após as férias coletivas. Agora, as primeiras unidades começam a chegar às lojas, mas as vendas são marginais até o momento.

Fora o aumento de preço - em torno de 8% a 10% em relação à linha anterior -, ainda há muitas dúvidas sobre o uso do novo caminhão, assim como existem receios sobre a capilaridade da rede de abastecimento do diesel de baixo teor de enxofre utilizado pelo veículo - apesar do esforço da Petrobras de expressar a garantia de suprimento em anúncios na mídia.

Como é comum na introdução de regras que exigem uma mudança nos hábitos do consumidor no cuidado com o produto, as montadoras tentam encontrar alternativas para quebrar as resistências. Vale, como no caso da Scania, bancar o fornecimento do agente redutor de óxidos de nitrogênio - o Arla 32 - nos primeiros meses de uso do novo caminhão.

"Estamos com um trabalho de informar o consumidor. Já treinamos a rede (de revendas) e investimos em propagandas educativas. Mas sempre existe uma restrição ao que é novo", comenta o supervisor de marketing da Ford Caminhões, Marcel Bueno Silva.

Alguns contratos importantes já foram fechados, com entregas programadas para os próximos meses. A operadora logística JSL - que prevê comprar cerca de 2,8 mil caminhões neste ano - informa que, até agora, encomendou 50 caminhões da Scania e 160 da Volkswagen. Os veículos devem chegar entre março e junho.

No total, a Scania diz que sua carteira de pedidos soma 1,2 mil unidades a serem entregues até o fim do mês que vem.

Junto com a dura tarefa de convencer transportadores de que o novo veículo não é um "bicho de sete cabeças", as montadoras se concentram neste momento em pulverizar os primeiros lotes da linha Euro 5 para a rede de distribuição.

"Estamos em um momento de apresentação da linha nas concessionárias. Começamos a produzir no mês passado e neste mês vamos preencher o canal de vendas para mostrar o produto ao cliente", diz Tania Silvestri, diretora de marketing da Mercedes-Benz, vice-líder de mercado. "Temos 100% das atividades focadas em Euro 5", acrescenta.

O consumidor, contudo, ainda dá preferência aos caminhões da linha antiga, que responde praticamente pela totalidade dos emplacamentos neste começo de ano. "Já ouvimos muitas intenções de compra, mas nada foi fechado até agora", conta Airton Vieira, diretor da Cofipe, concessionária da Iveco com duas revendas em São Paulo.

A resistência não surpreende a indústria. Nos últimos meses do ano passado, o setor trabalhou na formação de estoques da linha antiga - chamada de Euro 3 - para fazer frente à demanda durante o período de transição de mercado.

A estratégia incluiu o uso de linhas de crédito com taxas de juros subsidiadas por bancos de montadoras para o custeio do capital de giro no período em que um grande volume de caminhões ficará parado nos pátios das concessionárias.

Embora existisse a expectativa de que o mercado seguiria girando em torno do Euro 3 nos primeiros meses de 2012, a produção dessa linha não é mais permitida desde janeiro. Daí houve a necessidade de formar grandes estoques desses produtos.

Nas revendas de caminhões da Rodobens, uma das maiores concessionárias da Mercedes-Benz, os veículos da linha Euro 3 representam em torno de 90% a 95% dos estoques. Segundo Ademir Odorício, diretor geral da Rodobens Caminhões e Ônibus, são aproximadamente mil veículos, com giro estimado em um mês e meio. "Optamos por formar estoques nos últimos quatro meses", afirma o executivo.

O problema é que agora as montadoras precisam desovar um volume residual de caminhões parados nas fábricas. Ford e Iveco - duas fabricantes que admitem ainda ter alguns caminhões em estoque - dizem que vão despachar as unidades até o fim de março, como determina o programa de controle da poluição do ar.

No entanto, a tarefa se torna mais difícil quando os primeiros resultados do ano mostram que o mercado dá sinais de inflexão, após o recorde de vendas de 2011 (veja gráfico ao lado). Segundo dados da Fenabrave, a entidade que representa as concessionárias de veículos, os emplacamentos de caminhões caíram 6,45% primeiros quinze dias de fevereiro, em relação a igual período do ano passado.

Para estimular as vendas, a Ford está oferecendo taxa zero no financiamento em 18 meses das últimas unidades da linha Euro 3 do modelo Transit a empresas.

Em geral, as previsões do setor apontam para uma estagnação, ou mesmo queda, do consumo de caminhões neste ano, refletindo um arrefecimento natural do consumo após a forte antecipação de compras feitas por transportadoras para fugir de aumentos de preços.

Nas estimativas da MAN, líder no mercado brasileiro com a marca Volkswagen, o mercado deve recuar 15% em 2012, o que levou a matriz na Alemanha a projetar queda de receita este ano. Por sua vez, a direção da Scania trabalha com a perspectiva de estagnação na demanda por caminhões. A tendência é de um cenário mais difícil no primeiro semestre para todo o setor, com recuperação a partir da segunda metade do ano.

Valor Econômico