Venda de carros elétricos sobe 41% no Brasil em 2022, mas esbarra na falta de infraestrutura
O mercado de veículos elétricos registrou aumento de 41% nas vendas em 2022, segundo novo levantamento da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). Apesar do potencial, o setor ainda enfrenta um grande desafio: a falta de infraestrutura de carregamento para carros de usuários comuns, ônibus ou caminhões.
O ano fechou com 49.245 unidades emplacadas e uma frota circulante de 126.504 veículos. Segundo estudo realizado pela Boston Consulting Group, a necessidade de investimentos no mercado de infraestrutura nacional de carregamento para mobilidade elétrica será de R$ 14 bilhões até 2035.
Enquanto o setor demanda infraestrutura de carregamento para se desenvolver, o mercado consumidor resiste a aderir aos veículos elétricos diante da ausência de postos de carregamento.
Para a resolução desse impasse, os especialistas avaliam que é necessário aderir a um plano nacional de desenvolvimento sustentável, com o fomento ao mercado de veículos eletrificados.
O presidente da ABVE, Adalberto Maluf, explica que a infraestrutura de recarga é um desafio para alguns nichos da eletromobilidade. A maior parte das recargas é feita pelas pessoas no período noturno, mas houve um aumento de veículos comerciais leves, que por vezes exigem uma recarga rápida na rua.
— Os dados poderiam ser ainda mais animadores se tivéssemos ações integradas com universidades e um plano nacional. Importamos muita tecnologia de fora, mesmo carregadores — afirmou.
Para Maluf, embora políticas fiscais sejam importantes para fomentar o crescimento do mercado, é necessário buscar ações que ultrapassem incentivos tributários.
Mapeamento em São Paulo
Ele cita como exemplo uma iniciativa da prefeitura de São Paulo que mapeou, ao lado de motoristas, os melhores lugares na cidade para construir pontos de recarga. Na sequência, foram feitas concessões privadas para as obras de infraestrutura.
Ainda assim, na avaliação do chefe de mobilidade da empresa de tecnologia Siemens, Paulo Antunes, a mobilidade elétrica só vai ganhar escala quando a experiência do usuário com o veículo elétrico for mais parecida com o veículo comum.
— Enquanto o carregamento elétrico pode levar cerca de uma hora, o veículo a combustível é carregado em minutos — pontuou.
Segundo Antunes, o principal entrave é viabilizar viagens de longas distâncias com carros elétricos, justamente por conta dos poucos pontos de carregamento em rodovias. No mais, os pontos públicos existentes ainda são muito lentos.
Por isso, a infraestrutura de carregamento ultrarrápido — com potência superior a 150kW — seria estratégica na adoção de veículos elétricos em escala, de acordo com a Siemens.
— Ao mesmo tempo, para montar a infraestrutura de carregamento, são necessários transformadores, cabos e painéis de média e baixa tensão. Eventualmente, a distribuidora de energia ainda precisa disponibilizar mais demanda naquele local — completou.
Prioridade deveria ser transporte público
Para Maluf, da ABVE, o transporte público deve ser eletrificado primeiro, justamente por conta da preocupação com emissões:
— O mundo inteiro eletrificou primeiro o transporte público. Há cinco anos, a venda de ônibus elétricos já representa mais de um terço de todos os ônibus vendidos no mundo. É necessário pensar em adaptação climática, em como usar o veículo elétrico dentro de um plano de resiliência das cidades.
Antônio Jorge Martins, coordenador de cursos automotivos da Fundação Getúlio Vargas, discorda dos demais especialistas ouvidos pelo GLOBO. Ele pondera que todo mercado, quando ainda é reduzido, tende a transparecer crescimento elevado, como aconteceu na telefonia celular há uns anos.
Na avaliação do especialista, o mercado ainda é muito incipiente no exterior e pouco robusto no Brasil. Sobretudo em um país de tamanho continental, a infraestrutura de cargas elétricas deve estar devidamente distribuída e nem na Europa isso é uma realidade.
Poucos postos de recarga
De acordo com estimativas de associados do Grupo de Infraestrutura da ABVE, existem atualmente cerca de 3 mil eletropostos públicos e semipúblicos espalhados pelo país. No entanto, Martins estima que deve haver três pontos de recarga distribuídos para cada dez veículos no país.
Atualmente, esse índice é de aproximadamente 0,24 postos a cada dez veículos. É uma estrutura que exige investimentos muito grandes para crescer, mas as montadoras também estão envolvidas com desenvolvimento de tecnologia.
— Todas as empresas de bateria ainda continuam desenvolvendo suas tecnologias, o que demanda altos investimentos. Há o propósito de aumentar o tempo de uso dos carros elétricos, com carga embutida no veículo para uma maior quilometragem, por exemplo — explicou.
O especialista conta que, até então, o uso intensivo de um carro elétrico faz com que a sua bateria sofra perdas de carga ao longo do tempo, diminuindo sua capacidade. É um problema decorrente da tecnologia, que tende a evoluir.
Outro ponto é que o Brasil deveria se preparar para o crescimento no setor de carros elétricos que, embora represente ganhos expressivos em sustentabilidade e tecnologia, pode levar a um aumento no desemprego, sobretudo no momento econômico delicado em que o país enfrenta.
— Os carros a combustão geram problemas com emissão, mas contam com milhares de peças. O carro elétrico tem duzentas, trezentas peças.
Autor/Veículo: O Globo